Faz pleno sentido que Stereossauro use para título do seu novo álbum o indicativo telefónico internacional para Portugal, +351.
Nas suas viagens fora do país – para, por exemplo, participar em campeonatos mundiais de Djing onde já arrecadou alguns títulos em parceria com DJ Ride –, há-de muitas vezes ter usado esse indicativo para ligar para casa. E é de ligações a uma “casa” que se faz este novo trabalho. Trata-se de um lugar musical, claro, uma “casa” que o próprio Stereossauro construiu a pulso, dotando-a de muitas divisões – a do hip hop e do gira-disquismo, por um lado; a divisão da eletrónica mais pulsante e servida por graves fundos; essa outra ampla sala onde Stereo sempre arrumou as suas grandes referências – de Amália e Carlos Paredes a Carlos do Carmo, Camané e tantos outros nomes que sempre o inspiraram. Uma casa onde há uma cozinha em permanente rebuliço, o lugar onde o chefe Stereossauro testa novas receitas, aprimora sabores e de onde saem muitos repastos para os nossos ouvidos.
Nos últimos anos, Stereossauro construiu um lugar tão sólido quanto ímpar para a sua música: surpreendeu meio mundo quando reinventou o clássico “Verdes Anos” de mestre Paredes trazendo-o para o presente, provou não haver fronteiras quando reuniu, no mesmo Bairro da Ponte, Carlos do Carmo e Ana Moura, Camané e Capicua e tantos outros artistas para o que foi, sem dúvida, um dos mais aclamados álbuns de 2019. E de lá para cá, não tem havido tempo para descansar: lançou Desghosts & Arrayolos em 2021, trabalho em que Carlão, Marisa Liz, xtinto, Áurea, Manuel Cruz, Blaya, Sara Correia ou Ricardo Ribeiro marcavam presença; cruzou-se com o saxofonista Cabrita no álbum Cachorro Sem Dono de 2022; “descobriu” Ana Magalhães no seu Tristana, em 2023; e, já este ano, juntou forças com o rapper Mura para um dos melhores trabalhos deste arranque de ano, o álbum ADAMAS. Se a isto se somarem participações pontuais em projetos como Sg Gigante, a homenagem hip hop a Sérgio Godinho imaginada por Capicua, e muitas dezenas de concertos, fica-se com uma ideia de como Stereossauro leva a vida em permanente estado de criação. +351 é a nova consequência dessa profunda inquietação que o leva a desafiar-se constantemente.
É o próprio Stereossauro que explica que este disco até já devia ter acontecido: “É quase à Tarantino, na verdade, com o fluxo da história a ver as suas voltas trocadas – este álbum deveria ter sido feito antes do Bairro da Ponte e logo depois do ‘Verdes Anos’”. Só que, como o próprio Stereo reconhece, “o Bairro da Ponte agigantou-se”. Mas com o tempo finalmente domado, o Dj, produtor e compositor pode voltar à sua “cozinha” para preparar novo banquete de 12 pratos.
+351 volta a encontrar Stereossauro em modo rigorosamente instrumental, num ambicioso trabalho que é, na verdade, uma reflexão sobre o lugar da guitarra na sua música, uma homenagem aos instrumentos que bastaram para que “Verdes Anos” alcançasse a imortalidade: a guitarra portuguesa, mas também a viola acústica. Para tanto, Stereo chamou vários mestres: Ricardo Gordo, seu inseparável companheiro desde Bairro da Ponte; Ângelo Freire, que conheceu quando trabalhou com Sara Correia; José Manuel Neto, uma paixão antiga, admite o produtor; e a maior referência da guitarra portuguesa da atualidade, mestre António Chainho – “conversámos muito antes de gravar”, admite o produtor. Mas Stereossauro foi mais longe, alargando o espectro de sons neste novo trabalho das cordas de aço da guitarra portuguesa às de nylon das violas de Tó Trips, de quem Stereossauro se diz admirador há muito tempo, e de Pedro Jóia, mestre da guitarra com alma mais flamenca que por cá temos. Como convidados adicionais no álbum encontram-se ainda o inseparável companheiro de muitas aventuras DJ Ride – “acho que nunca fiz um trabalho em que ele não tenha marcado presença” – Celina da Piedade, que toca acordeão em “Nova Balada da Despedida”, uma reinvenção de um velho standard coimbrão, e finalmente de Ana Magalhães, a voz de Tristana que tem dois discretos apontamentos em dois dos temas do álbum.
Há outra “participação” muito especial em +351 – Bordalo II é o autor da obra que surge na capa, uma peça escultórica que usou vários objetos musicais que Stereossauro foi colecionando ao longo dos anos já com esta ideia na cabeça: “O Bordalo é talvez o meu artista plástico português favorito. Adoro o facto das suas obras carregarem sempre importantes mensagens. Eu estudei artes plásticas e essa foi sempre a dimensão da arte que mais me apaixonou, a que me fazia coçar a cabeça, que me intrigava e provocava. Quando o abordei com a minha ideia ele aceitou de imediato. Uma honra para mim”.
Entre Março e Agosto de 2023, Stereossauro produziu os temas que integram o alinhamento de +351 e mais umas quantas dezenas de ideias e experiências a que poderá voltar no futuro. “Tenho muitos projetos em mãos”, revela ele, “e sei que este não será certamente o último álbum que faço em torno da guitarra portuguesa”.
Em +351, dispensando o peso da palavra que tem explorado nos seus álbuns mais recentes, mas não a dimensão poética que sempre identificou na peculiar sonoridade da guitarra portuguesa, Stereossauro volta a criar uma banda sonora para um possível filme sobre o Portugal contemporâneo, um país em que passado, presente e futuro dançam juntos, em que diferentes culturas dialogam e se entendem. O país para que sempre ligamos quando as viagens nos levam mundo fora.
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