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Segunda 2

Companhia Paulo Ribeiro

29 e 30 outubro de 2021 – 21h00
M/6 anos
Duração aproximada: 60 minutos
Pequeno Auditório

SEGUNDA 2
Há vinte e seis anos criei a primeira peça da Companhia Paulo Ribeiro: Sábado 2. Foram tempos em que acreditei e acreditámos que tudo seria possível. O mundo prometia abertura, a Europa consolidava um projecto comum e Portugal estava empenhado em tornar-se maior. De sábado a segunda passou um fim-de-semana e um quarto de século. Foi belo, foi intenso e, sobretudo, permiti tornar sonhos em realidade. O momento actual obriga a algum balanço. Às vezes, à força de fazer, há um olhar que se pode perder num tempo que nos ultrapassa.

SEGUNDA 2
Segunda 2 parece-me ser a lógica continuação de um projecto que é obrigatoriamente de autor e que surge do imperativo de voltarmos todos a uma suposta normalidade. Um trabalho individual com o foco no colectivo. É o início da semana, o momento propício para produzir e ir em frente. Aprendemos todos muito com os tempos que a nível global fomos obrigados a (ultra)passar. Voltamos a projectos âncora, voltamos com vontade de fazer melhor, voltamos com a dimensão do sonho e a vontade de recuperar o tempo que ficou para trás. Voltamos com a imensa vontade de voltar a estar próximos, de celebrar a vida, de reencontrar a festa.

SEGUNDA 2
É uma coreografia que se desafia a si própria, que se coloca no limiar da falha que será sempre uma aliada e não uma adversária. Uma peça que convoca algumas memórias de tantas outras e que, nos seus percursos secretos, se inspira em muito daquilo que os tempos nos têm dado. Não olhamos para a falha como obstrução, assim como não olhamos para todos os sonhos desfeitos, os impasses que teimam em ser condição de vida, as dinâmicas culturais, tantas vezes inconclusivas, a tentativa vã de fixar e construir.

A dança continua num lugar confinado, mas isso não nos interessa, na próxima segunda tudo vai mudar, se não for na próxima será na outra, ou na seguinte, e para isso acontecer, vamos continua a desafiarmo-nos, a brincar, a provocar e exorcizar a falha. Vamos ser singulares e colectivos. Vamos reencontrar a festa. Vamos reencontrar o corpo. Vamos continuar a dançar.

Paulo Ribeiro
(o autor escreve segundo o antigo Acordo Ortográfico)

26 ANOS COMPROMETIDOS COM O PRESENTE E O FUTURO

Conversa entre Paulo Ribeiro e Fernando Luís Sampaio em agosto de 2021.

Em 2020, a Companhia Paulo Ribeiro [CPR] completou 25 anos de existência. Para o contexto nacional, é um percurso assinalável. Como foram estes 25 anos?
Os 25 anos, que agora já são 26, foram notáveis. Logo a partir da primeira peça, Sábado 2, criada no CCB, tivemos imensas digressões que nos faziam estar um dia em Nova Iorque, dois dias mais tarde em Berlim, Budapeste, Paris, etc. Para além da intensa circulação internacional, começámos e concretizámos o projeto do Teatro Viriato, em Viseu. No fundo, a Companhia está comprometida com o presente e o futuro. Apesar de todas as oscilações a que todos estamos sujeitos, a CPR tem conseguido manter esse compromisso.

És bailarino e simultaneamente diretor artístico da Companhia. A tua carreira de bailarino não se ressentiu desta acumulação de responsabilidades?
A minha carreira de bailarino não se ressentiu, apesar de ter tido desafios muito interessantes como intérprete no momento em que decidi dedicar-me mais à coreografia. O convite que o Jorge Salavisa me fez para coreografar para a Gulbenkian foi decisivo para «cimentar» o meu regresso definitivo a Portugal. Mais tarde, com a CPR, fui ainda durante muito tempo intérprete das minhas peças.

Há 25 anos surgiu a Nova Dança Portuguesa, fruto da vontade de criar condições profissionais para muitas estruturas. Que esperança depositaste no futuro da dança portuguesa?
Sempre achei que a dança portuguesa poderia ter as mesmas condições profissionais, visibilidade e reconhecimento nacional e internacional que as suas congéneres europeias. Ainda hoje acredito ser possível… No entanto, confesso algum desapontamento. Os momentos fortes de afirmação da Dança Portuguesa não foram suficientes para criar raízes. Nunca saímos de uma dimensão «artesanal».

Embora a tua Companhia se tenha projetado além do território nacional, pensas que a tão propalada internacionalização dos criadores portugueses tem tido visibilidade? O que falta fazer?
A visibilidade dos criadores portugueses tem acontecido, mas é dispersa e inconsequente. A meu ver, é preciso pôr de pé a diplomacia cultural. Não basta sermos recebidos para um almoço na Embaixada quando estamos numa cidade importante e damos nas vistas, são precisas démarches constantes de aproximação de divulgação e difusão, é necessária uma missão nesse sentido. A diplomacia deve ter esse desígnio: divulgar ao máximo a cultura do seu país, neste caso a dança. Trabalhamos pouco com o resto do mundo e pouquíssimo com os países de língua portuguesa. Os nossos colegas franceses, belgas, alemães, etc., têm organismos que lhes garantem circulações e residências pelo mundo inteiro. O nosso alheamento é de tal ordem que, para dar um exemplo, em 2009, quando o Ballet de Nancy apresentou as minhas peças do Ballet Gulbenkian no Théâtre de la Ville, em Paris, eu não fui entrevistado por uma única rádio ou televisão portuguesa.

Durante anos foste responsável pela direção artística do Teatro Viriato, em Viseu. A rede de teatros então criada pelo país abriu novas perspetivas de políticas culturais. Em tua opinião, elas cumpriram-se?
As novas perspetivas de políticas culturais vão-se cumprindo. É verdade que o país dispõe neste momento de equipamentos fantásticos, agora, em muitos casos, falta o resto, que são condições para poder programar. Estamos constantemente a ser confrontados com orçamentos mínimos, a ginástica é sempre enorme para poder programar com um mínimo de dignidade. Não há nenhum equipamento neste país que tenha um orçamento que lhe permita sonhar, nenhum que possa aproximar-se da escala de um parceiro europeu.

Atravessamos este transe pandémico que causou profundas feridas no tecido cultural. Que futuro para as artes performativas? O que falta fazer?
O momento é muito difícil e confesso que não sei responder. Os agentes culturais, os artistas, os equipamentos, as instituições, não têm baixado os braços e continuam a trabalhar intensamente. Fazem tudo o que podem para manter viva a esperança e a vontade de um futuro melhor… Quanto ao que falta fazer, penso que a resposta já está dada. É preciso investir mais e de forma mais séria nas dinâmicas culturais.

Que projetos tens para a tua companhia? Mais 25 anos?
Mais 25 anos certamente que não, ou pelo menos comigo. Tenho muitos mais projetos e são os mesmos que há muito tento pôr de pé, que muitas vezes vislumbram uma luz ao fundo do túnel, mas afinal é uma ilusão de ótica. Uma Casa da Dança, uma companhia com elenco fixo, um espaço próprio que acolha, coproduza e apresente, uma rede efetiva de parcerias a nível mundial. A Dança como linguagem ou Arte Incontornável.

Paulo Ribeiro
Natural de Lisboa, foi em várias companhias belgas e francesas que fez carreira como bailarino, até que os seus passos conduziram-no à criação coreográfica.

A estreia enquanto coreógrafo deu-se em 1984, em Paris, no âmbito da companhia Stridanse, da qual foi cofundador, e que o levou à participação em diversos concursos naquela cidade, obtendo, logo no ano da estreia como criador, o prémio de «Humor» e, no ano seguinte, em 1985, ganhou o 2.º prémio de «Dança Contemporânea», ambos no Concurso Volinine.

De regresso a Portugal, em 1988, começou por colaborar com a Companhia de Dança de Lisboa e com o Ballet Gulbenkian, para os quais criou, respetivamente, Taquicardia (Prémio «Revelação» do jornal Sete, em 1988) e Ad Vitam. Com o solo Modo de Utilização, interpretado por si próprio, representou Portugal no Festival Europália 91, em Bruxelas.

A sua carreira de coreógrafo expandiu-se no plano internacional, a partir de 1991, com a criação de obras para companhias de renome: Nederlands Dans Theater II (Encantados de Servi-lo e Waiting for Volúpia), Nederlands Dans Theater III (New Age); Grand Théâtre de Genève (Une Histoire de Passion); Centre Chorégraphique de Nevers, Bourgogne (Le Cygne Renversé); Ballet de Lorraine (White Feeling e Organic Beat). Para o Ballet Gulbenkian, criou ainda: Percursos Oscilantes, Inquilinos, Quatro Árias de Ópera, Comédia Off-1, White e Organic Beat, Organic Cage, Organic Feeling.

Entretanto, em 1994, o criador foi galardoado com o Prémio «Acarte/Maria Madalena de Azeredo Perdigão» pela obra Dançar Cabo Verde, encomenda de Lisboa 94 – Capital Europeia de Cultura e realizada conjuntamente com Clara Andermatt.

Em 1995, fundou a Companhia Paulo Ribeiro, para a qual já criou as seguintes coreografias: Sábado 2 (1995); Rumor de Deuses (1996); Azul Esmeralda (1997); Memórias de Pedra – Tempo Caído (1998/2019); Ao Vivo (1999); Comédia Off (2000); Tristes Europeus – Jouissez Sans Entraves (2001); Silicone Não (2003); As Memórias de um Sábado com Rumores de Azul (2005); Malgré Nous, Nous Étions Là (2006); Masculine (2007); Feminine (2008); Maiorca (2009); Sábado 2 (remontagem 2010); Paisagens – onde o negro é cor (2010); Jim (2012); Sem um tu não pode haver um eu (2013); Modo de Utilização (1990/2014); A Festa (da Insignificância) (2015); Ceci n’est pas un film – Dueto para Maçã e Ovo (2016), Walking with Kylián. Never Stop Searching (2017) e, mais recentemente, Le Chef D’Orchestre (2019) para a Companhia Nacional de Bailado (CNB) em coprodução com o Theatre National de Chaillot.

O trabalho com a própria companhia permitiu-lhe desenvolver melhor a sua linguagem como coreógrafo. E o reconhecimento não tardou. Logo em 1996, a obra Rumor de Deuses foi distinguida com os prémios de «Circulação Nacional», atribuído pelo Instituto Português do Bailado e da Dança, e «Circulação Internacional», atribuído pelo Centro Cultural de Courtrai, ambos no âmbito do concurso Mudanças 96. Em 1999, o coreógrafo venceu ainda o Prémio «Almada» atribuído pelo Instituto Português das Artes do Espetáculo.

Ao longo da carreira, tem ganho vários outros prémios de relevo, como o «Prix d’Auteur», nos V Rencontres Chorégraphiques Internationales de Seine-Saint-Denis (França); o «New Coreography Award», atribuído pelo Bonnie Bird Fund-Laban Centre (Grã-Bretanha), o «Prix d’Interpretation Collective», concedido pela ADAMI (França); ou ainda o «Prémio Bordalo» da Casa da Imprensa (2001).

Em 2009, recebeu mais duas distinções: o prémio «Coreógrafo Contemporâne», no 1.º Portugal Dance Awards, e o prémio do «Público», no Dance Week Festival da Croácia. Recentemente, foi galardoado com o prémio «Melhor Coreografia de 2010» pela Sociedade Portuguesa de Autores, pelo espetáculo Paisagens – onde o negro é cor.

A par do trabalho que tem desenvolvido na sua companhia de autor, Paulo Ribeiro foi comissário do ciclo Dancem, em 1996 e 1997, no Teatro Nacional São João. Desempenhou, entre 1998 e 2003, o cargo de diretor-geral e de Programação do Teatro Viriato/CRAEB (Centro Regional das Artes do Espetáculo das Beiras), e foi ainda comissário para a Dança em Coimbra 2003 – Capital Europeia da Cultura.

Em 2006, regressa ao Teatro Viriato, para reocupar o cargo de diretor-geral e de Programação, isto após a extinção do Ballet Gulbenkian, que dirigiu entre 2003 e 2005, tendo nesse período recebido o «Prémio Bordalo» da Casa da Imprensa Portuguesa (2005) pelo trabalho desenvolvido com esta companhia.

Em 2008, participou como coreógrafo na produção Evil Machines, de Terry Jones, para o São Luiz Teatro Municipal. Em 2010, coreografou o espetáculo Sombras, de Ricardo Pais. E, em 2011, criou Desafinado, para o grupo Dançar com a Diferença (Madeira), e ainda um quarteto para o espetáculo coletivo Uma Coisa em Forma de Assim, com a CNB, para a qual criou seguidamente Du Don de Soi, um espetáculo de noite inteira, sobre o cineasta Andrei Tarkovsky, e Lídia, em 2014. O criador ainda trabalhou no cinema, com a conceção da coreografia para La Valse, um filme de João Botelho.

Paulo Ribeiro tem-se ainda dedicado à formação, orientando vários workshops em Portugal, mas também em países onde a companhia tem marcado presença. Lecionou a disciplina de Composição Coreográfica, no âmbito do mestrado de Criação Coreográfica Contemporânea, promovido pela Escola Superior de Dança, e deu aulas no Conservatório Nacional de Dança.

Em 2016, Paulo Ribeiro deixou a direção do Teatro Viriato e da Companhia Paulo Ribeiro, para assumir a direção artística da CNB, a convite do Ministério da Cultura, até julho 2018.

Em 2019, lançou o projeto Casa da Dança em Almada.

Companhia Paulo Ribeiro
Criada em 1995, a Companhia Paulo Ribeiro é uma companhia portuguesa de dança contemporânea, com um repertório próprio de peças, maioritariamente criado por Paulo Ribeiro (tendo recebido vários prémios nacionais e internacionais); mas também por outros criadores convidados. Estrutura residente no Teatro Viriato desde 1998, é a partir daí que desenvolve a sua atividade de pesquisa, de criação, de produção, de difusão e de formação em dança contemporânea.

A par da implementação do projeto artístico do Teatro Viriato em 1998, em 2005 a Companhia Paulo Ribeiro foi também responsável pela criação da escola de dança Lugar Presente (Viseu) com Ensino Artístico especializado em dança.

Com um repertório de mais de 30 produções, a Companhia Paulo Ribeiro é uma das mais reconhecidas companhias de dança contemporânea portuguesas.

Além dos principais eixos de atividade, a Companhia Paulo Ribeiro tem ainda promovido a edição. Em 2005, foi lançado o livro Corpo de Cordas, da autoria de Cláudia Galhós, uma edição comemorativa dos 10 anos de existência da Companhia; e em 2015 foi a vez de Uma Coisa Concreta, um livro coordenado por Tiago Bartolomeu Costa, que reúne um conjunto de textos de Isabel Lucas, Luísa Roubaud, Maria de Assis, Mónica Guerreiro e Paula Varanda.

Ficha artística
Coreografia, direção artística e montagem sonora Paulo Ribeiro
Interpretação Ana Jezabel, Ana Moreno, Catarina Keil, Margarida Belo Costa, Pedro Matias, Sara Garcia e Valter Fernandes
Desenho de luz Nuno Meira
Figurinos José António Tenente
Organização de objetos cénicos (cenografia) João Mendes Ribeiro
Produção Companhia Paulo Ribeiro
Coprodução Centro Cultural de Belém, Centro Cultural Vila Flor, Teatro Nacional São João, Teatro Viriato e Cine-Teatro Louletano

A Companhia Paulo Ribeiro é uma estrutura financiada pela República Portuguesa – Cultura/Direção-Geral das Artes.

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